A cozinha
como temos hoje, não é apenas um estilo, mas um processo histórico.
O Fogo
Elemento
fascinante! Energia da vida.
A nossa
casa, ou o nosso ambiente de abrigo surgiu graças ao fogo. Esse nosso reduto de
proteção sempre se organizou em torno do calor.
Sabe-se que
quando os homens deixaram de ser nômades e começaram a cultivar a terra, eles desenvolveram
as atividades da culinária e da olaria (utensílios), os alimentos eram cozidos
ao ar livre e o fogo era tido como um bem comum.
Mas manter o
fogo sempre aceso era trabalhoso e feito por equipes e instrumentos criados para
essa manutenção, como por exemplo, a invenção do Fole.
Vale lembrar
aqui que o fósforo foi inventado somente em 1827 na Grã Bretanha!
Com o passar
do tempo esse “fogo” foi levado para dentro das habitações e utilizado também
como calefação, através de dutos subterrâneos, lareiras e chaminés, porém essa operação
de aquecer e cozinhar criou vários inconvenientes. Como a fumaça trazia fuligem
para a casa toda, as famílias mais abastadas construíam a cozinha numa edificação
à parte da residência, independente do resto da casa.
A cozinha
torna-se um lugar de serviço.
A cozinha
brasileira
Quando os portugueses chegaram aqui, trouxeram com eles inúmeros
utensílios, desde fogões até tachos e chaleiras, inclusive o recurso da chaminé
com a intenção de aquecer os ambientes.
Porém, tão logo chegaram aos
trópicos foram aos poucos incorporando a maneira indígena de cozinhar, na qual, sob uma cobertura rústica, acendia-se uma fogueira, apoiava-se o caldeirão sobre o
fogo, agachava-se e começava-se a cozinhar. Eram essas ações que compunham nossas
primeiras cozinhas brasileiras.
Por ser uma
cozinha bem rudimentar, sem refrigeração, com animais de pequeno porte andando
livremente, ficava localizada bem
longe da casa, pois a noção de higiene não era a mesma que possuímos hoje.
Um tempo
depois o fogão saiu do chão e se transformou em algo parecido com os fogões à
lenha que conhecemos do interior do nosso país.
E a
água?
A água é outro
elemento indispensável na cozinha e depois de certa urbanização já estava começando a correr com mais
facilidade. Foi no século 18 que as grandes cidades já contavam com aquedutos
que despejavam água nos chafarizes públicos e era ali onde os escravos iam apanhá-la
para o uso doméstico. Já no campo, eram implantadas canaletas de bambu do rio
mais próximo até o quintal, tornando assim mais prático o trabalho diário.
Foi somente
na segunda metade do século 19 que as transformações mais significativas para a
arquitetura da cozinha brasileira começaram a aparecer e ficarem um pouco mais
próxima do que temos ainda hoje.
Com a
Revolução Industrial, as residências da elite do café, da borracha e do açúcar
traziam as novidades vindas da Europa. Chegavam com certo atraso, mas chegavam.
Nessa época, surgiram
na Europa os primeiros fogões a gás e, com isso, a cozinha ficou livre da fumaça
e da fuligem. No Brasil, foi em 1901, no palácio do governo de São Paulo, que
se instalou o primeiro fogão a gás de que se tem notícia, e a moda não demorou a
pegar, aposentando de vez os velhos fogões à lenha.
No final do
século 18 que surgiram os primeiros refrigeradores. Foi em 1860 que apareceram
as primeiras geladeiras nos lares americanos. Não chegava a ser um
eletrodoméstico e conforme descreve o arquiteto historiador Carlos Alberto
Cerqueira Lemos,
“Eram armários de madeira, revestidos
por dentro com cortiça e folha de flandres. Havia uma prateleira no alto, onde
se apoiava a pedra de gelo (produzida em fábricas) comprada por assinatura e
uma canaleta que conduzia a água do degelo para um balde. O entregador passava
todo dia, bem cedinho, de porta em porta.”
A cozinha
mais limpa
A torneira
havia sido inventada em 1800, a construção da rede de abastecimento de água aos
domicílios começou no Rio de Janeiro 76 anos depois e o surgimento dos ladrilhos
hidráulicos laváveis para revestir piso e parede deixaram o preparo dos
alimentos muito mais prático e higiênico e com isso não era mais preciso deixar
a cozinha do lado de fora da casa.
A
transformação da cozinha sempre esteve ligada aos métodos combustíveis.
Com a origem da energia elétrica, começou a era das facilidades, surgiram os
primeiros eletrodomésticos: liquidificador, batedeira, torradeira. Aqui no
Brasil, a primeira geladeira elétrica chegou em 1928. Então, a partir de 1930,
solucionados os problemas de combustível do fogão e dos fornos, a cozinha
começou a se adaptar em módulos e foi convertida em uma sala de máquinas com
fogão, forno, geladeira, pia e armários. Isso tudo gerou muita transformação na
arquitetura da cozinha, inclusive da brasileira.
Se até o
começo do século 20 a cozinha era um lugar quente, desconfortável e de muito trabalho
braçal, passou a ser um ambiente mais fresco e convidativo. Com isso, o
comportamento da dona de casa também se modificou e ela começou a passar mais
tempo ao redor do fogão. Por isso, a década de 1950 é o símbolo da nova cozinha,
os eletrodomésticos foram popularizados e a arquitetura brasileira passou
por uma grande transformação. Portanto, a cozinha se tornou uma extensão da sala
de estar e surge assim a Copa Cozinha.
A cozinha
da nova era
A cozinha
então até podia ser bonita, porém ainda tínhamos a tradição de enxergá-la como
um ambiente de serviço e, por isso, pessoas estranhas e de fora da residência não
eram convidadas a conhecê-la. Esse comportamento permaneceria inalterado e
começaria a desaparecer somente na década de 1980.
O que
chamamos de “cozinha americana” tem como responsável o Forno Micro-ondas.
Ele foi inventado
em 1946 e era comum nas casas estadunidense nos anos 1960, mas só entrou nas residências
brasileiras em 1985. Então, com novos jeitos de cozinhar e não produzindo as
mesmas sujeiras e odores, a cozinha não precisava mais ficar escondida!
Nos últimos 30 anos, a cozinha passou por uma revolução. De lá pra cá, com a inovação das
cidades, o aperfeiçoamento industrial, a mudança nos hábitos de trabalho, automação
e dinâmica profissional, a cozinha passou a ser ambiente integrado a outros espaços da casa.
Atualmente, os projetos arquitetônicos procuram compor sala de estar, cozinha e área de
lazer num mesmo ambiente, porque momentos familiares, tarefas domésticas e
convivência são compartilhados por todos os moradores. Os equipamentos contemporâneos são projetados a fim de proporcionar uma fácil manutenção, funcionalidade e estética. Hoje, o “calor” da cozinha é elaborado através de
sensações das cores, iluminação, texturas e revestimentos, isso tudo graças à
tecnologia dos materiais e evolução industrial.
Todos esses
elementos juntos proporcionam essa integralidade com a casa inteira, incluindo
a área externa: os Espaços Gourmets.
Um outro
fator importante que podemos considerar para essa visibilidade da cozinha nos
dias atuais é a função do Chef de Cozinha. Esse profissional da gastronomia conseguiu
nos mostrar como pode ser prazeroso e divertido esse momento que se passa junto ao
fogão. Todos nós queremos aprender com ele.
A
arquitetura desfruta disso tudo e desenvolve novas ideias e conceitos para esse
ambiente vivencial, desde o espaço construído até os designs dos objetos,
conseguindo refletir a personalidade dos donos da casa. Essa personalidade e
comportamento do morador são expressados através dos móveis, dos acabamentos,
no estilo de cozinhar e na relação familiar.
A cozinha
contemporânea, sendo em espaços grandes ou espaços pequenos, está integrada
como ambiente social, ala de convívio, ela é o coração da casa e pode promover união,
aconchego e harmonia.
A cozinha do Futuro
Daqui pra
frente, a ideia da cozinha do futuro estará intrinsecamente ligada à tecnologia,
automação e mobilidade, agregada sempre à evolução do maquinário, dos
equipamentos e dos acabamentos.
Ao mesmo
tempo que a cozinha se torna a protagonista da casa, fazendo-nos voltar no
tempo e resgatar o desejo e a satisfação do cozinhar, ela vai ao encontro de uma
novidade, que é esse convívio sociável dentro da cozinha. Ela deixa de ser
somente um ambiente de necessidade e serviço doméstico e passa a ser também o
espaço de prazer e lazer dentro de casa.
Por Annie Carrera
***
Referências:
LEMOS, Carlos A. C.: Casa paulista, Editora EDUSP, 1999
ZABALBEASCOA, Anatxu:
Tudo sobre a casa, E-book Kindle, 2020
https://aventurasnahistoria.uol.com.br/noticias/galeria/em-imagens-a-historia-da-cozinha-no-brasil.phtml
https://fabiolastrauszinteriores.com.br/evolucao-da-cozinha/
ARQ.DOC - Ep 3 | Cozinhas: Arquitetura e Afeto,
https://www.youtube.com/watch?v=XZSfm0tCToM&feature=youtu.be